A Torre

O homem abriu os olhos com os primeiros raios de sol e constatou que estava molhado. O chão de sua torre estava inundado.

“Torre” é exagero. A construção consistia de um pequeno chão rústico (cheio de água) e paredes irregularmente construídas que não passavam de meio metro de altura.

Levantou do chão duro e olhou ao seu redor. Não estava vendo os inimigos ainda, mas sabia que estavam à espreita. Era questão de tempo.

Não entendeu exatamente como a água brotara daquele chão que estava tão seco quando se deitara no dia anterior, mas contra fatos não há argumentos: pôs-se a retirar a água, fazendo conchinha com as mãos.

Quando enfim terminou, sentou-se junto à parede para descansar e olhou para cima, para o céu que já exibia todo o seu azul. E viu um corvo. Já o conhecia. Sabia até seu nome: Instagrão. Se percebesse uma aproximação maior, estava pronto para lançar-lhe pedras.

Respirou profundamente e iniciou os trabalhos do dia: levantar as paredes de sua torre. Cuidadosamente colocou mais uma pedra sobre a parede, mas, assim que o fez, ouviu um estampido forte às suas costas: estavam derrubando as pedras do outro lado da torre! Quando correu para ver quem estava lá, levou um bofetão e, zonzo, agarrou-se como pode no que ainda restava da estrutura. Logo, porém, estavam já dentro da torre e davam-lhe socos e pontapés.

Quando desistiram de bater, estava dolorido e cansado, mas ele já havia decidido antes que precisava construir a torre, custe o que custasse, e continuou.

Mais tarde, feliz com o progresso que havia feito — a torre estava melhor do que ao amanhecer —, resolveu sair e passear pelo terreno em volta da torre. Estava tudo tão calmo que julgou que não haveria problemas, que seus inimigos haviam já encerrado suas atividades por hoje.

Ledo engano. Ao sair, imediatamente pisou em espinhos, que furaram seus pés. Não cresciam espinhos ali, claro; eram presentes deixados pelos outros.

Voltou para dentro da torre e retomou o trabalho, pois sabia que sua única chance contra os inimigos era erguer e melhorar sua fortificação.

À noite, ao dormir, ficou aliviado, pois sabia que, pelo menos enquanto dormia, não haveria sofrimento — mesmo se acabasse acordando novamente ensopado.